A utopia está lá no horizonte.
Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos.
Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei.
Para que serve a utopia?
Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.”
Como você inteligentemente já deve ter suspeitado, o texto que abre esta crônica não é meu, mas de um poeta Uruguaio, Eduardo Galeano.
A palavra UTOPIA tem origem no grego “ou”, de “não”, e “topia” de “LUGAR” ou seja, a utopia é um “não lugar”, um lugar que não existe.
Conceitualmente, UTOPIA seria uma SOCIEDADE IDEALIZADA, maravilhosa, que seja perfeita para TODOS.
Só que na prática, esse ideal utópico é não apenas difícil de obter quanto impossível, porque a ideia de PERFEIÇÃO não é comum a todos. O que é perfeito para alguns é imperfeito para outros.
Nesse sentido, a busca de uma sociedade homogênea, supostamente perfeita para todos, seria algo um pouco assustador, uma imposição do Estado ou de uma classe que domina o poder e impõe o seu ideal de perfeição para todos. E isso seria o contrário de UTOPIA, seria uma DISTOPIA, ou seja, uma sociedade em que se vive sob dominação e opressão, em que um ente autoritário decide e impõe o que deveria ser o ideal comum.
Se para alguns a sociedade ideal é aquela em que as ruas sejam asfaltadas, as janelas sejam de blindex e a trilha sonora seja do DJ Alok, para outros o ideal é o retorno à natureza, com estradas floridas, uma casa em cima da árvore e trilha sonora dos Los Hermanos.
E pra outros UTOPIA é ter almoço na hora do almoço e janta na hora da janta.
E se a UTOPIA é impossível pra que ela serve então?
Como disse Galeano, pra que gente continue perseguindo um ideal de mundo, ainda que imaginário, porque toda grande obra começa antes na nossa imaginação. A Utopia serve pra que a gente continue tendo a capacidade de imaginar que é possível um jeito das coisas serem melhores do que são. Pra que a gente não fique cínico. Pra que a gente não se conforme com o que não está bom. Pra que a gente não ache que o errado é que tá certo. Pra que a gente continue perseguindo o horizonte mesmo quando ele teimosamente se insiste em se afastar da gente.
E já que eu peguei inspiração em Eduardo Galeano para abrir esta crônica, vou tomar emprestado mais um pedaço de sua obra para encerrar o raciocínio: O Direito ao Delírio:
Que tal se delirarmos por um tempinho
Que tal fixarmos nossos olhos mais além da infâmia
Para imaginar outro mundo possível?
(…)
Nas ruas, os carros serão esmagados pelos cães.
As pessoas não serão dirigidas pelos carros
Nem serão programadas pelo computador.
Nem serão compradas pelos supermercados
Nem serão assistidas pela TV,
(…)
Será incorporado aos códigos penais
O crime da estupidez para aqueles que a cometem
Por viver só para ter o que ganhar
Ao invés de viver simplesmente
Como canta o pássaro sem saber que canta
E como brinca a criança sem saber que brinca
(…)
Seremos imperfeitos
Porque a perfeição continuará sendo o aborrecido privilégios dos deuses
Mas neste mundo, trapalhão e ferrado,
Seremos capazes
De viver cada dia como se fosse o primeiro
E cada noite como se fosse a última.
– Eduardo Galeano