Depois de incansáveis declarações efusivas de tantos amigos sobre o filme Bohemian Rhapsody, que narra a trajetória de Freddie Mercury e da banda Queen, me rendi às evidências e fui assistir ao filme.
Escolhi cuidadosamente o cinema, considerando sobretudo a qualidade do som. Se o enredo não agradasse, a trilha sonora, sendo Queen, não teria como decepcionar.
O filme está longe de ser uma obra prima da sétima arte: o enredo, além de raso, está recheado de clichês, simplificações maniqueístas e situações caricaturais que em certos momentos beiram o inverossímil. Mas justiça seja feita, o filme é um deleite para os fãs da banda e competente em contar a saga que transformou um quase dissoluto e obscuro trio de Londres (Smile) numa das maiores bandas de rock de todos os tempos.
Qualquer elogio musical à banda nunca será exagero. Conseguiram a proeza de misturar refrões populares a uma alquimia musical de impecável qualidade técnica. Eram uma banda de rock sim, mas eram também folk, pop, dance, ópera, canção. Eram populares sendo quase eruditos. Eram músicos, na acepção mais nobre do termo.
Recheando o enredo, a vida conturbada do líder da banda, o cantor Freddie Mercury, que na realidade era apenas o pseudônimo de Farrokh Bulsara, um dentuço suburbano filho de um imigrante do Zanzibar, que teimava em não se encaixar nos moldes que o pai projetou para ele.
A história da banda é mais do que um conto de fadas (com pitadas de tragédia) como muitos do show biz. É também uma história de empreendedorismo.
A primeira qualidade que a gente vê na banda, e sobretudo em Freddie Mercury era a VISÃO. Ele era capaz de projetar, na sua mente, a grandiosidade que o Queen seria capaz de obter, mesmo quando ele ainda nem era vocalista da banda. E quando toda a lógica apontava para a repetição da fórmula bem sucedida do primeiro álbum, ele aposta num experimentalismo ousado, misturando rock e ópera. O filme é muito competente em mostrar o processo criativo e a busca de novas soluções que geraram a maravilhosa Bohemian Rhapsody que dá título ao filme. Foi essa mesma visão do futuro que estimulou a banda a vender o furgão que usavam para viajar para investir na gravação em estúdio de um disco de demonstração, que acabou propiciando a contratação da banda por uma grande gravadora.
O filme mostra também a importância de encontrarmos um propósito maior, o nosso verdadeiro papel na vida, de fazermos aquilo em que somos melhores, aquilo que nascemos para ser. Por diversas vezes Freddie Mercury mostra que ele tinha muito claro na mente dele o que ele era, no que ele era bom de verdade e o que queria fazer para sempre. Suas obras eram apenas a manifestação de seu EU mais fundo. Ele estava simplesmente sendo ele, na sua melhor forma.
E por fim, o filme mostra o poder dos grandes times. Por mais que Freddie Mercury tivesse um papel destacado na banda (e no enredo), em algum ponto da carreira ele acaba cedendo ao apelo de uma milionária (e curta) carreira solo, mas a qualidade do que produz não estve à altura do que o Queen produzia, mesmo se cercando de músicos muito competentes. Faltava alma. Faltava a guitarra inconfundível de Brian May, ou a batida de Roger Taylor. Não era o Queen.
Não se constrói grandes bandas nem grandes obras nem grandes empresas sozinho. Um grande líder ajuda um bocado, mas ele precisa não apenas inspirar outros a seguir seus sonhos, mas também reunir o melhor time possível para que o conjunto da obra esteja à altura da grandiosidade do sonho. Existem súditos, e existiu o Queen.
They are the champions, my friend.