Quando era criança ouvia fascinado histórias de astronautas. Cresci nos anos 70 e 80, onde ainda soavam os ecos da corrida espacial e das frequentes missões tripuladas ao espaço.
Como seria levitar sem gravidade? E o que acontece com o xixi na gravidade zero? Fica flutuando perdido no meio da aeronave? Eeeeca…
Mas uma das coisas que mais me intrigavam era a alimentação deles. Dizia a lenda que tudo que os astronautas comiam cabia em cápsulas, espécie de remédios com mega dosagens dos nutrientes necessários para eles sobreviverem longe da Terra.
Eu, que sempre fui um afortunado magrelo glutão (hoje mais glutão do que magrelo), não achava a novidade muito interessante. Que graça teria comida sintética com forma de pílula e jeitão de remédio? Ainda que fosse uma cápsula de picanha grelhada com farofa crocante e arroz fumegante, que graça teria, tendo que ingerir em formato de cápsula?
Acho que a indústria alimentícia andou pegando carona nessa onda das coisas sintéticas. E nem estou falando de nuggets de frango com papelão não.
Há alguns anos, uma famosa marca de batatas onduladas (aquela, que tem a batata sabor churrasco), lançou um concurso nacional para coletar sugestões de sabores diferentes para as batatas. E malucos de todo o Brasil enviaram as mais esdrúxulas sugestões: calabresa com cebola, mostarda e mel, strogonoff, burritos e até mesmo feijoada. E esses sabores não foram os mais exóticos não, foram justamente os vencedores da competição. Como é pouco provável que eles misturem feijoada ou strogonoff na batata, a solução obviamente passa por aromatizantes artificiais. Comida sintética, ou uma versão piorada da comida de astronauta. Embora na hora da fome eu prefira uma batata feijuca do que uma cápsula sideral.
Mas é claro que as coisas não iriam parar por aí.
Recentemente li o artigo de uma revista britânica que fala de uma empresa de tecnologia que vende vinho sintético. Isso mesmo, até mesmo o altar sagrado dos enófilos está sendo vilipendiado pelo poder disruptivo da tecnologia. Segundo o fundador da empresa, tudo no Universo é constituído de átomos, como se fossem brinquedos feitos de peças microscópicas de Lego, e portanto podem ser reconstruídos. Então, o trabalho deles é detectar as características do vinho quanto a textura, aroma, fluidez, decodificar seus diversos componentes e ir junto lé com cré, ou ácido X com reagente Y, até chegar numa versão sintética do vinho. Os resultados ainda são um bocado controversos, mas a brincadeira está só começando.
Diz a lenda que breve teremos carne sintética, diamante sintético e muito mais.
Talvez seja melhor do que as pílulas de refeições dos astronautas, mas não deixa de ser uma mudança do outro mundo. Enquanto isso não ocorre, vou me deliciando com a velha e boa comida vinda de onde sempre veio: do chão, da árvore e da fazenda.
Vai uma feijuca aí?