Nunca se falou tanto em empoderamento feminino quanto agora. As mulheres conquistam cada vez mais espaço na sociedade e no mercado de trabalho, mesmo em profissões tradicionalmente associadas aos homens. Mas essa ainda é uma situação longe de ser resolvida, porque as mulheres ainda são minoria na direção de empresas e na liderança de países. E com muita frequência a mulher ganha menos do que os homens mesmo quando ocupando posições similares.
Apesar disso, há mais de dois mil anos, uma mulher, em Alexandria, comandou um dos maiores impérios da antiguidade, o Egito. Essa mulher foi Cleópatra, a famosa rainha do Egito, uma mulher inteligente, culta, ambiciosa e muito a frente de seu tempo. Ela chegou ao poder ainda garota, com 18 anos e liderou o Egito por longos vinte anos.
Eu voltei recentemente de uma viagem ao Egito e me causou uma certa estranheza que não se fale tanto em Cleópatra quanto a fama dela me faria imaginar o que talvez se explique por algumas coisas:
- Cleópatra não tinha sangue Egípcio, ela era de Alexandria, mas sua linhagem era grega Ptolomaica;
2) Ela governou numa época em que o Egito estava perdendo protagonismo político e cultural para outros impérios como o Grego e Romano;
3)- Otávio, que viria a se tornar Cônsul e Imperador de Roma, enfurecido com a influência que Cleópatra conquistou junto aos líderes romanos, mandou destruir todos os templos e monumentos erguidos em homenagem à Cleópatra como forma de apagar seu nome da História. Ele tentou mas não conseguiu e é possível que isso tenha ajudado a expandir a mitologia em torno de seu nome.
Mas se engana quem acha que a conquista do poder foi fácil. Cleópatra era filha do Rei Ptolomeu XII, mas no Egito a preferência era sempre pelo filho homem, no caso seu irmão Ptolomeu XIII, que na época era apenas uma criança. Aliás, ela era casada com um dos irmãos, uma tradição dos faraós egípcios como forma de não deixar que o poder escapasse das mãos da família. Havia um pacto de divisão do poder entre Cleópatra e o irmão mais novo, mas isso não funcionou e logo o Egito estava em Guerra Civil. Acuada e em situação desfavorável, Cleópatra decide pedir ajuda ao poderoso general de Roma, Julio César, que já estava em rota de colisão com o Senado Romano. Mas ela se aproxima de César de um jeito bastante inusitado, enrolada dentro de um tapete, como se fosse um presente do Egito para ele. César ajuda Cleópatra a assumir o trono no Egito e eles logo engatariam um romance e teriam um filho. Parecia um plano perfeito. Ela ao mesmo tempo garantiria alguma estabilidade ao Egito, freiando a fúria expansionista romana, subiria ao poder no Egito e colocaria seu filho, Cesarião, na linha sucessória de dois importantes impérios, o Egípcio e o Romano.
Mas a História nem sempre respeita os nossos planos. Tudo azedou quando os Senadores de Roma armaram uma emboscada para César e o assassinaram. Marco Antônio acabou assumindo o controle de Roma e adivinhem por quem que ele se apaixonou? Sim, por ela mesma, Cleópatra. E ele ficou tão enfeitiçado por ela que se mudou de mala e cuia pro Egito, causando um escândalo em Roma, que naquela época tinha mais fofoca que o Facebook.
No final das contas, Otávio, sobrinho de César e inimigo político de Marco Antônio, invadiu o Egito com a promessa de levar Cleópatra algemada para desfilar pelas ruas de Roma como troféu de guerra. Vendo a derrota iminente, Marco Antônio se matou. Cleópatra, apaixonada, também. Ela, eterna rainha do Egito, preferiu morrer a ser humilhada em praça pública.
O amor às vezes pode ser mais perigoso que a guerra.
Isso foi há mais de dois mil anos. Ao longo de milênios de história, Cleópatra foi uma das poucas mulheres a governar o império egípcio.
E se no Antigo Egito uma mulher chegar ao poder não era fácil, em pleno século XXI governar o Egito parece uma tarefa ainda mais difícil, porque a cultura política do país torna muito improvável que uma mulher assuma o poder, o que mostra que em matéria de empoderamento feminino o país talvez tenha regredido alguns milênios e muito ainda há por ser conquistado.
Pelo menos sempre nos restará a memória de Cleópatra, a eterna Rainha do Egito.
Alexandre Correa é professor da FGV, escritor e palestrante corporativo. Ele está no YouTube, no Facebook, no Linkedin, no Instagram, no SPC e no Serasa. E não está no Tinder porque sua mulher não deixa.É autor dos livros “Pesquisas de Opinião Pública” (2017) e”Longevidade Inteligente” (2020).