Perspectiva

shutterstock_146314307Daqui do alto tudo parece menor, e você se sente, acima de tudo, bem mais poderoso do que realmente é.

Soltando o dedo médio que pressiona o polegar direito dou um peteleco imaginário que libera uma energia comparável a treze bombas atômicas, lançando aquele pequeno retângulo, ato único, da Via Dutra diretamente para uma savana desabitada no interior da Tanzânia.

Porque a quarenta e três mil pés de altitude tudo ganha uma perspectiva diferente.

Seus problemas parecem menores. Diminutos. Formigas anãs. Carretas gigantes viram minúsculos retângulos, inofensivos, quase imóveis. Tão pequenos que você poderia catapultá-los a um voo transcontinental com um simples peteleco.

Visto dessa janelinha de cantos arredondados, tudo ganha um novo olhar, uma nova dimensão.

Você sabe que sua vida está nas mãos de misteriosas divindades randômicas que habitam o azul infinito acima da sua cabeça e daqueles dois cilindros Honeywell cuspindo vento ao lado do seu nariz.

É como se tudo ficasse em suspensão nesse momento, um imenso stand by. Saldo negativo, chefe rabugento, metas inalcançadas, unha encravada ou o pênalti perdido. Todos os problemas passam em brancas nuvens, o sólido vira fluido e agora você reina soberano, alguns quilômetros acima de todos eles. Você se permite ignorar a alta do dólar, a baixa da bolsa ou a crise na Ucrânia para ficar fazendo abstrações infantis, associando nuvens a pessoas e objetos.

A questão é saber por que precisamos desse distanciamento físico para dimensionar corretamente nossos problemas. É tudo uma questão e perspectiva ou não? É tudo física ou é tudo percepção?

Olhar o céu estrelado numa noite clara pode ter o mesmo efeito. Já parou para pensar na merdidão de nada que somos na imensidão do cosmos?

Tantas estrelas, tantos planetas, tanta imensidão inavegada e você cultivando úlcera porque um infeliz te fechou no cruzamento da Ipiranga com a São João? Encaremos a nossa triste pequenez cósmica: os astros continuarão sua órbita determinada a despeito da nossa existência. Vivemos a angústia cósmica de um universo que não conseguimos compreender por completo. Tentamos preencher com lógica ou fé toda a angústia existencial gerada pelo vazio da incompreensão.

Somos nós que damos significado às coisas. Podemos ser maiores do que os nossos problemas, mas somente com a perspectiva certa.

Aí então o monstrengo afobado pousa suas patas de aço e borracha no asfalto rugoso e percebo, entre aliviado e frustrado, que todos os meus problemas me aguardam ali do lado de fora, na cabine pressurizada da vida, esperando que eu dê um jeito neles antes que tomem conta de tudo, cortem minhas asas e não me deixem voar tão alto quanto desejo nessa viagem interminável para dentro de mim mesmo.

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