– Essa aeronave é equipada com quatro saídas de emergência.
– Não, não. Eles pagaram quatro mil e novecentos e ainda está faltando mil e quinhentos.
– Mantenha o cinto de segurança afivelado sempre que o aviso luminoso estiver aceso.
– Eu acho melhor a gente tentar falar primeiro com o Silvio, pra ver se ele resolve o problema diretamente com o financeiro deles.
– Em caso de despressurização da cabine máscaras de oxigênio cairão automaticamente.
– Mas não libera a mercadoria não, se não a gente não vai receber a outra parte.
– Em caso de pouso na água retire os assentos flotantes embaixo da sua poltrona.
– Chama o Jurandir então pra resolver isso duma vez.
– Senhor o avião vai decolar, o senhor precisa desligar seu celular.
– Desejamos a todos um bom voo.
– Chama o Jurandir logo que a aeromoça já ta aqui querendo que eu desligue, Vanderlei.
Nessa altura, não era mais a aeromoça que queria que ele desligasse o telefone na cara do Vanderlei, mas todos os outros duzentos e trinta e sete passageiros, que já sabiam em detalhes toda a contabilidade da firma, e não queriam correr o risco de uma interferência nos equipamentos do avião por conta desse bate boca inoportuno.
Tudo bem que ele queira morrer em pleno voo por conta dos mil e quinhentos reais do segundo boleto que não foi pago, mas os outros passageiros não tinham nada a ver com isso. Nem tampouco eu, na fileira ao lado.
– Senhor, desligue esse telefone agora !
– Vai logo Vanderlei, chama o Jurandir que essa aeromoça está me aperriando aqui.
– Desligue!
– Só mais um minutinho dona aeromoça, suplicou o passageiro, que tinha um vozeirão que se fazia ouvir em todas as poltronas daquele voo.
Logo uma pequena vaia começou a se ensaiar no fundo do avião e se espalhar pelo corredor.
A aeromoça, num ato de valentia repentina, tomou o celular da mão do sujeito, desligou e disse que o aparelho só seria devolvido ao final do voo.
Aplausos aliviados ecoaram pelo avião, sufocando o som das turbinas que começavam a rosnar raivosas.
O passageiro praguejou alguma coisa ininteligível e disse que o Jurandir iria processar a companhia aérea assim que o avião pousasse.
Cinco minutos depois dormia com a cabeça pendida para a esquerda, para alívio de todos os passageiros daquele voo e do Vanderlei que não precisou mais atendê-lo.