Naif

cosacNinguém esperava.

Era uma das mais sólidas do segmento. Reconhecida por seu elevado padrão de qualidade. Admirada por autores, críticos e pelo mercado. Após quase 20 anos de operação, a editora Cosac Naify anunciou o encerramento de suas atividades. Não porque tenha sido ceifada pela crise econômica, ou não apenas por isso, já que isso também contou. Mas porque seu fundador, um abastado apaixonado por arte e livros, que tocou a editora mesmo sem nunca ter sido um grande negócio, refletiu que sua criação estava cada dia mais distante dos propósitos maiores que lhe deram origem. Então, preferiu encerrar as atividades enquanto ainda podia sentir orgulho do que criou.

A decisão é mesmo triste.

Primeiro, porque vindo de um empresário diletante como ele, soa como praticar eutanásia no próprio filho.

Segundo, porque escancara uma realidade dura, que fingimos não ver ou não sentir. A tecnologia, na mesma velocidade vertiginosa com que cria novidades interessantes, tem tido um efeito devastador sobre uma infinidade de negócios supostamente bem estabelecidos.

A indústria do livro é uma delas. Quem hoje em dia ainda devora catataus de 500 páginas como o fazia há 20 anos? Digo por mim. Sou um obcecado por livros, mas já não leio tanto (livro) quanto lia no passado. Talvez porque consuma zilhões de fragmentos de informação o dia todo, que pulam sem pedir licença da minha parafertralha digital: celular, tablet, TV e computador.

Ganhei um monte de brinquedo que consome minha atenção o dia todo, mas meu dia continua tendo as mesmas 24 horas da época do meu teratataravô das cavernas.

Enquanto escrevo esta crônica, leio na versão online do New York Times um artigo de Teddy Wayne lamentando a lenta morte dos objetos físicos de cultura, como livros e cd’s. Segundo o autor, a presença cada vez menor de artefatos físicos nos lares deve provocar uma mudança aguda no modo como nos relacionamos com o consumo de cultura. Impossível saber o resultado disso tudo no longo prazo. Talvez seja uma mudança no final das contas positiva, mas só o tempo dirá.

Dia desses vi uma placa de “aluga-se” na maior e mais tradicional vídeo locadora da minha cidade. Morte anunciada. Ninguém entrava mais lá dentro. Mais um negócio morto pela internet, pela TV a cabo e pelos DVD’s piratas.

Todo dia nasce gente, todo dia morre gente. É o ciclo da vida. É o ciclo dos negócios. No final do dia, preso num congestionamento a bordo de um carro coreano com ar condicionado e GPS, ninguém lamenta a extinção das charretes.

Espero que um dia a gente implante chips de cultura atrás da orelha.

Enquanto esse dia não chega, eu continuo vestindo minha alma de luto toda vez que eu vejo uma livraria virar papelaria e uma editora virar história…

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