Ela

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– Nunca amei ninguém como eu te amo.

-Eu também te amo, meu amor.

O dialogo entre Theo e sua namorada seria de uma obviedade singular, não fosse Samantha um sistema operacional de computador.  Isso mesmo, um sistema, como o Word ou o Excel.

É o enredo do filme “Ela”, lançado em 2014 no Brasil, onde em um futuro não muito distante sistemas dotados de inteligência artificial são capazes de se relacionar conosco, emulando voz, diálogos e sentimentos de um ser humano.

Após o divórcio, o escritor Theo acaba se apaixonando por Samantha, esse ser criado pela junção de bits e algoritmos. Samantha sente ciúmes, paixão, atração sexual, angústia e euforia.

Fascinante ou assustador? O quão distantes estamos de um mundo assim?

Recentemente a Microsoft criou um perfil no Twitter, chamado Tay, totalmente baseado em inteligência artificial, programado para ir se moldando às interações com os usuários da rede. A experiência fez enorme sucesso nos primeiros dias, mas logo o projeto teve que sair do ar, quando o protótipo de tuiteiro começou a postar frases como:

O feminismo é um câncer” ou “será que o holocausto realmente existiu?”.

Resumindo, virou um xiita digital.

Não é fácil criar um sistema inteligente, mas já há notáveis avanços nessa área.

Tenho um amigo que não cansa de fazer galhofa com seu smartphone, dando ordens verbais para seu assistente do Google:

-OK Google, favor me acordar às sete horas!

-OK Google, responda: em que dia nasceu o Chacrinha?

E nao é que o Google acata e processa todas as ordens, como se fosse um escravo

digital?

Parece ficção científica, mas é apenas um aplicativo gratuito que já vem incorporado na

maioria dos novos celulares.

O futuro se descortina apressado diante dos nossos olhos vidrados e é impossível prever o que a tecnologia nos reserva, mas ainda falta um bocado para que a ciência consiga reproduzir em laboratório a intrincada gama de pensamentos e sentimentos que são naturalmente gerados pela mente e alma humanas.

O computador faz cálculos com velocidade espantosa. Mas teria capacidade de prever com precisão os complexos mecanismos da Teoria da Relatividade, como o fez Einstein um século atrás?

Teria condições de pintar (ou projetar) a Capela Sistina?

Comporia a quinta sinfonia?

Sentiria piedade, praticaria alguma forma de altruísmo?

O filme é belamente construído e mostra não apenas as fronteiras imponderáveis que podem surgir da relação entre homens e máquinas, mas sobretudo a dificuldade e a beleza de construir relacionamentos a dois num mundo individualista e solitário.

Em dado momento, Theo cai na besteira de perguntar a Samantha se ela se comunica com outras pessoas enquanto conversa com ele.

-Sim, me comunico.

-Com quantas pessoas você está conversando neste momento?

-Com 8316.

-8316? Você está apaixonada por mais alguém?

-Meu amor… Acredite, eu queria ter essa conversa com você antes, mas não sabia como…

-Responda, está apaixonada por mais algum usuário?

-Sim…

-Quantos?

-641…

(Theodore desaba por dentro e Samantha percebe)

-Você pode nao acreditar, mas isso não diminui em nada minha loucura por você. O coração não é uma caixa que se enche. Ele se expande quanto mais você ama…

-Sou diferente de você, Samantha.

-Isso não me faz amá-lo menos. Aliás, me faz amá-lo mais.

-Isso não faz o menor sentido.

-Você é minha ou não é?

-Não, Theodore. Eu sou sua e não sou sua.

Não tem jeito, é uma luta perdida antes de começar. Nossos cérebros ainda vêm com o software Caverna 2.0, e jamais venceremos um sistema operacional. Não fomos programados para isso.

A Samantha digital pode ser um sistema operacional perfeito (apesar dos 641 amantes) mas jamais substituirá as pessoas de verdade, inclusive com seus defeitos, porque quando se ama até os defeitos são qualidades. Como diz o protagonista Theodore em um de seus devaneios nostálgicos pensando na ex mulher:

-Ah, que saudades daqueles dentinhos tortos…

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